sábado, 31 de maio de 2008

Já tenho ouvido...

Das Edições Nova Ática, leio o opúsculo «Novos Factores da Política Portuguesa», que Eça de Queirós fizera publicar pela primeira vez na «Revista de Portugal», em 1890, e deparo com o parágrafo:
"O Partido Republicano em Portugal nunca apresentou um programa, nem verdadeiramente tem um programa. Mais ainda, nem o pode ter porque todas as reformas que, como partido republicano, lhe cumpriria reclamar, já foram realizadas pelo liberalismo monárquico. Decorre que se vai para a república ou se tende para ela, não por doutrinarismo, por urgência de mais liberdade e de instituições democráticas, mas porque numa já considerável parte do País se vai cada dia radicando mais este desejo: antes qualquer coisa do que o que está!
(...) porque esses espíritos sentem todos os dias uma aversão maior pela política parlamentar, tal como ela se tem manifestado".
E pergunto-me: mas não é esta mesma aversão que já se vai sentindo em muitos espíritos?

Postais antigos- A loucura da guerra



Tenho-o por cima da lareira.
Debaixo de um céu muito azul, uma menina de cabelo castanho-dourado, contempla a paisagem que alcança da janela, no fim de um rio de águas calmas. Aparentemente tudo é paz, e há uma grande harmonia no conjunto...
Paz ilusória, porque no céu surge um avião a lançar bombas, indiscriminadamente...

O Nuno deu-lhe o título «Momento de Civilização».

«A curiosidade matou o gato»

Vendo esta fotografia, tirada no deserto de Ténéré, na Nigéria, em que o gato se aproxima perigosamente duma jibóia do deserto, vejo o alcance literal do ditado popular...

sexta-feira, 30 de maio de 2008

«El dia que me quieras»

Para alegrar as señoritas de Botero enquanto não chega o barco com os marujos, retardados pelo canto de outras sereias...

"O Menino Jesus enganou-se"

Foi no Natal do ano em que começaram a cair-me os dentes de leite. No dia vinte e cinco de Dezembro esperávamos, ansiosos, pela autorização de entrarmos na cozinha, onde, na noite anterior, puséramos, cada um dos oito irmãos- a mais nova não havia ainda nascido-, o sapato no fogão de lenha.
A curiosidade dera-me asas, pelo que fui a primeira a chegar aos presentes: em cada um dos sapatos das quatro raparigas vi um fantoche; dos outros dois não guardo lembrança- apenas dos "protagonistas" do episódio:
No meu estava uma velha desdentada, e no de uma irmã mais nova uma princesa, com coroa, que logo cobicei. A troca foi feita em poucos segundos...
Quando a minha irmã pequena chegou, e viu o que lhe "coubera", disse, desconsolada: o Menino Jesus enganou-se; eu não sou a mais velha...

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Mariana

vem ali o teu António, e traz a Cantarinha.
- E vem com a camisa que lhe fiz com bordados de Guimarães

Bordados de Guimarães

Cantarinha dos Namorados ou das Prendas


" A Cantarinha maior significa a abundância perene que se deseja ao futuro casal, semeada de esperanças rutilantes.. A Cantarinha menor , despida de enfeites, significa a vida real, as incertezas do amanhã.
Quando um rapaz escolhia aquela que deveria ser a sua companheira, e se dispunha a fazer o pedido oficial aos pais da " futura" , oferecia à namorada uma Cantarinha das Prendas.
Se esta era aceite, ficavam, a partir deste momento, comprometidos.
A Cantarinha seria então para guardar as " prendas" que o noivo e os pais da noiva ofereciam, em ouro, como cordões, tranceletes, corações, cruzes, borboletas, arrecadas..."
(«Oficina» de olaria, Guimarães)

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Lenço dos Namorados

"É tam certo eu amarte
Como branco o lenço ser
Só deixarei de te amar
Quando o lenço a cor perder"

Pela Estrada Fora

Tínhamos vários dias pela frente, e iríamos aproveitar para visitar as várias Aldeias Históricas do distrito da Guarda.
Linhares, no concelho de Celorico da Beira seria a primeira paragem.
Lera já que a sua fundação, atribuída aos Túrdulos, remontava, muito provavelmente, ao século VI A. C., mas que fora durante a Reconquista que sobressaira, dada uma situação geográfica privilegiada, propícia à defesa de toda aquela região, e já no século XII o Castelo de Linhares é referido como uma significativa barreira face às forças de Leão, razão pela qual D. Afonso Henriques lhe veio a conceder foral.
Seria, porém, durante o reinado de D. Manuel I que Linhares viria a conhecer os seus tempos áureos, e disso são testemunho , além do Pelourinho encimado pela esfera armilar, as muitas casas, onde são visíveis sinais da arquitectura que marcou esse período, como as muitas janelas manuelinas que pudemos admirar. Alguns desses solares encontravam-se em ruínas, como o belíssimo palácio dos Corte-Real.
Uma construção que logo se impõe é o Castelo, no alto de um grande maciço granítico, esse sim, bem preservado.

Era, porém, gritante o pouquíssimo movimento que encontrámos nas ruas medievais, ladeadas de graciosa casas de granito e calcetadas com a mesma pedra. Apenas alguns idosos, ávidos de companhia, a quem relatar as muitas histórias que envolvem Linhares da Beira, o que fizeram com notório orgulho.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Postais antigos- O "meu" Paul



Este, muito provavelmente um terreno alagadiço em tempos muito remotos, era o lugar das brincadeiras. A cada dia, logo que acabavam as aulas na Escola Primária, era para aqui que nos dirigíamos: os rapazes para jogar ao botão, antecessor do berlinde com que brincam os sobrinhos, e as raparigas entretínhamo-nos a fazer o nosso "flower power", enfeitando-nos com grinaldas de heras, que pendiam dos muros da quinta ao lado, pertença de uma senhora de Lisboa.
Era também aí que, uma vez por mês,, parava a carrinha Biblioteca Ambulante da Gulbenkian: era uma festa; cada uma de nós a chamar as amigas, aos berros, literalmente, porque tínhamos encontro marcado com as personagens dos livros de Enid Blyton- o «Noddy», primeiro, «Os Cinco» e «Os Sete»,depois...
O Paul continua lá, mas já não é o mesmo: dos muros da quinta (tão linda!) já não cai todo aquele arvoredo, que fazia as nossas delícias; as crianças da Escola deram lugar aos reformados, que aí vão jogar às cartas...
Hoje resolvi tirar umas fotografias, antes que o "meu" Paul desapareça por completo.

" Vamos à Feira do Livro"

Durante anos, a do Porto foi a única que conheci.
Era uma festa quando, no mês de Maio, e sempre num
Domingo à tarde, o meu pai anunciava: - "vamos à Feira do Livro". Numa rotunda da Boavista encharcada, e debaixo de fortes chuvadas tínhamos diante de nós a promessa de trazer um livro mais para casa. O primeiro que de lá trouxe foi-me oferecido por um senhor de uma Editora, que me deu a escolher entre dois livros verdes e grandes: «Heidi» e «O Gnomo»- optei por este, mas lembro-me de, depois, ter pensado que tinha escolhido mal...
Seguiram-se , noutros anos, os livros azuis da Condessa de Ségur: »Memórias de um Burro» para mim, «Os Desastres de Sofia» para a minha irmã.
Só muito mais tarde iria conhecer a do Parque Eduardo VII...

segunda-feira, 26 de maio de 2008

«Povo que lavas no rio»

No seguimento duma animada conversa com a Júlia, na caixa de comentários, sobre a barrela da roupa no rio, lembro as histórias que a minha mãe conta: essa era uma ocasião pela qual tanto ela como as amigas ansiavam, pois era nessa altura, enquanto a roupa, já lavada, corava ao sol, que namoravam.
Enquanto elas lavavam, os rapazes conversavam entre eles, mas logo que estendessem a roupa na erva, desciam até junto das lavadeiras, e aí ficavam, até que o sol começava a desaparecer...
"Ai não dávamos ponto sem nó" diz; "agora vocês não sabem divertir-se..."

«Povo que lavas no rio»

"Ainda que meu pai me bata,
E minha mãe me tire a vida,
Minha palavra está dada.
Minha mão está prometida"

Não era muito diferente o cantar da roda de amigas, entre as quais se encontrava a minha mãe, que acompanhava o esfregar da roupa nas pedras do ribeiro que atravessa a aldeia, enquanto os moços as olhavam do cimo da pequena ponte.

Uma outra visão de Camilo

É de todos conhecido o mau feitio de Camilo, mas por muitos ignorada uma outra faceta do seu carácter, trazida até nós pelo camilianista, seu contemporâneo, António Cabral.
Tinha este acto abonatório de uma índole generosa vindo a público nas páginas d'«O Primeiro de Janeiro» de 3 de Junho de 1890, pouco tempo, portanto, após a morte do escritor.
"Foi há muitos anos, na Póvoa de Varzim.
Camilo achava-se naquela praia, para onde fora com os filhos, que iam fazer uso dos banhos do mar.
No mesmo hotel em que estava Camilo, achava-se um medíocre pintor espanhol, que perdeu no jogo da roleta o dinheiro que levava.
Havia três semanas que o pintor não pagava a conta do hotel, e a dona, uma tal Ernestina, ex-actriz, pouco satisfeita com o procedimento do hóspede, escolheu um dia a hora do jantar para o despedir, explicando ali, sem nenhum género de reservas, o motivo que a obrigava a proceder assim.
Camilo ouviu o mandado de despejo, brutalmente dirigido ao pintor. Quando a inflexível hospedeira acabou de falar, levantou-se, no meio dos outros hóspedes, e disse: - A D. Ernestina é injusta. Eu trouxe do Porto cem mil réis que me mandaram entregar a esse senhor e ainda não o tinha feito por esquecimento. Desempenho-me agora da minha missão.
E puxando por cem mil réis em notas entregou-as ao pintor.
O espanhol, surpreendido com aquela intervenção que estava longe de esperar, não achou uma palavra para responder. Duas lágrimas, porém, lhe deslizaram silenciosas pela faces, como única demonstração de reconhecimento"

domingo, 25 de maio de 2008

Em jeito de agradecimento

a todos os amigos que vieram tomar um chá cá a casa, assim como a João Marchante, do«Eternas Saudades do Futuro», pelas amabilíssimas palavras de incentivo , esta imagem a carvão feita por um ancião de uma recôndita zona da China, que acho muito serena...

Passeios de fim-de-semana

Marialva foi, talvez, de entre as várias Aldeias Históricas visitadas, a mais impressiva.
Lembro-me de lá ter chegado, depois de percorrer caminhos invadidos por silvas e ervas daninhas, e ter tido a sensação de que chegara a um lugar encantado, que o tempo adormecera sem lhe quebrar nunca o dom de enfeitiçar, e onde, a cada esquina, tropeçávamos com o passado.
Mas um lugar abandonado...
Tinha lido em «Aldeias Históricas», das Edições Inapa, que " andando por aqui D. Afonso II, se tomou de amores por uma linda senhora de nome Maria Alva. Como não lhe podia oferecer o coração, o rei doou-lhe a terra onde vivia, baptizando-a de Marialva. Perpetuava, assim, o monarca enamorado o nome da sua amada."
Pode-se ficar indiferente a uma lenda tão bela?...

sábado, 24 de maio de 2008

Um chá acompanhado de palavras

«A história da palavra escrita é, antes de mais, a história de signos que graficamente expressam ideias e emoções. É um passo de gigante, um reflexo de que o Homem é um ser social e que gosta- precisa- de comunicar» (Livros, Histórias & Ideias ).

Por cá é uso comer-se uma galinha preta quando se inaugura uma casa, mas correr atrás duma galinha, com esta chuva, não é coisa que agrade a ninguém; faz-se um chá, preto, que seja;e põe-se uma música calma que permita o fluir das palavras...

«Deus quer, o Homem sonha e a obra nasce»

Mas esta nunca teria nascido, não fora a imensa generosidade do Paulo Cunha Porto, a quem envio estas flores, colhidas hoje de manhã num jardim de Braga
Muito obrigada, Paulo.
Beijo

Usurpando,

descaradamente, um título a João Marchante, do blogue «Eternas Saudades do Futuro»,escolhi , hoje na Livraria, como "Livro para hoje" este de Agustina, uma escritora que aprecio, integrando-a na mesma Escola de Camilo- o escritor eleito entre todos- que é afinal a de Tomaz de Figueiredo e de António Manuel Couto Viana...
Pelo que leio na contracapa e badana, até na temática há essa proximidade: "Maria Adelaide é uma mulher munida de uma alegria negra que é a de escapar ao amor da lei e às cumplicidades que a rodeiam"...